Na época do Oscar sempre surge uma velha questão: O Oscar influencia a bilheteria de algum filme? Eu tinha minhas dúvidas sobre este fato. Mas é inegável que em um caso específico ele foi fundamental. Estou me referindo ao filme Guerra ao Terror que levou o Oscar de Melhor Filme na última edição. Dirigido por Kathryn Bigelow (também agraciada como a Melhor Direção) este filme surpreendeu a todos pela visibilidade inesperada e por ter recebido seis estatuetas douradas.
Neste caso específico o Oscar influenciou a bilheteria. Não só isso, fez com que os próprios produtores corressem atrás do prejuízo comercial e lançassem o filme novamente em uma maior quantidade de salas americanas. No Brasil, ele se quer foi lançado no circuito de salas de cinema, ando direto para DVD. Eu, como dono de locadora ha 17 anos também não acreditei no filme e, na época do seu lançamento há mais de um ano, também não disponibilizei na locadora. Agora estou correndo atrás do prejuízo. Sinal direto da premiação do Oscar. Até então, ninguém tinha procurado por Guerra ao Terror na locadora e, a grande maioria, nem sequer sabia de sua existência. Depois daquele domingo no Teatro Kodak a coisa mudou. E muito.
Só fui assistir ontem à noite a Guerra ao Terror. O filme realmente impressiona pela qualidade da direção de arte, pela direção competente de Bigelow e pelo excelente desempenho de Jeremy Renner na pele do destemido sargento William Jemes. Apesar de ser um filme de guerra (assim foi classificado), eu diria que é um bom filme de suspense muito bem articulado visto que as cenas de explosões e tiroteios, que se esperaria de um filme do gênero, não acontece de forma gratuita. A cena que o pelotão fica encurralado pelo inimigo escondido num casebre é fantástica. Assim como a cena do Sargento William James desmontando as bombas escondidas num carro em frente ao prédio da ONU.
Mas a razão deste comentário, no entanto diz respeito a uma outra cena e num ambiente bastante diferente. Seria cômica não fosse trágica. A cena em questão é a seguinte: Ele termina sua missão e volta para casa depois de ter desmontado inúmeras bombas e ter colocado a sua vida (e a de seus colegas) em risco por diversas vezes. James, a esposa e o filho pequeno estão no supermercado e ela pede que ele vá pegar os sucrilhos em outra estante. Ele encontra um corredor enorme com centenas de pacotes do cereal. De todas as formas, cores, tamanhos e preços. Olha pra esquerda tem sucrilhos, olha para a direita tem mais sucrilhos ainda. E agora? Qual levar? A cena fica alguns minutos neste “suspense”. Ele deve ter pensado: É mais fácil ter que escolher o fio azul ao vermelho em uma bomba letal do que escolher sucrilhos! Na cena seguinte ele aparece embarcando novamente para 365 dias de novas missões como o destemido homem que desarma bombas.
Interessante este aspecto colocado por Bigelow. Parece uma cena trivial e até engraçada. Mas ela quer dizer muito mais que isso. Não fosse o fato de mostrar, na cena seguinte, que ele desiste da família para voltar para o campo de batalha. Evidentemente não foi a compra do maldito sucrilho que desencadeou todo este processo. Mas fica claro que ele não tem um relacionamento familiar completo com a mulher e, apesar de amar o filho, também não tem um vínculo afetivo tão forte para mantê-lo por perto. Apesar de salvar vidas de estranhos e de se importar muito mais com outras pessoas, ele não consegue ter vínculos com sua família. Prefere arriscar a vida e neste aspecto buscar um sentido para ela a ter que ficar e criar raízes. É mais fácil para ele salvar a vida dos outros do que salvar a sua própria. No filme isto fica bem claro pela forma quase irresponsável como ele atua no desarmamento destes artefatos letais.
Um filme para se assistir por diversos ângulos e perspectivas. Mas a cena do supermercado foi a que mais me impactou e a que mais me fez refletir sobre esta obra. James poderia fazer uma guerra ao descaso familiar e, antes de salvar a humanidade, salvar a si próprio. Talvez seja este o recado do filme.
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