O filme O Amante de Lady Chatterley (2022), dirigido por Laure de Clermont-Tonnerre, é a mais recente adaptação cinematográfica do romance homônimo de D.H. Lawrence, publicado originalmente em 1928. Esta versão busca trazer uma abordagem renovada para um dos livros mais polêmicos e influentes do século XX, ao mesmo tempo em que mantém a essência do material original. A produção, estrelada por Emma Corrin e Jack O'Connell, combina uma narrativa visual exuberante com atuações emocionalmente carregadas, entregando um drama romântico que dialoga tanto com o público contemporâneo quanto com os temas históricos da obra.
A história segue Constance "Connie" Reid, uma jovem aristocrata que se casa com Sir Clifford Chatterley, um baronete britânico. No início do casamento, há um vislumbre de afeto entre os dois, e Connie acredita que encontrou um parceiro progressista e compreensivo. No entanto, a relação começa a se transformar drasticamente quando Clifford retorna da Primeira Guerra Mundial paralisado da cintura para baixo. Sua incapacidade física reflete-se em sua personalidade: ele se torna mais frio, controlador e insensível aos desejos e necessidades emocionais de sua esposa. Ao longo do filme, Clifford se entrega a uma visão extremamente pragmática e autoritária da vida, focando-se exclusivamente em seus empreendimentos industriais e na tentativa de consolidar sua posição de poder. Ele chega até mesmo a sugerir que Connie tenha um caso apenas para engravidar e garantir um herdeiro, deixando claro que vê sua esposa mais como um meio para um fim do que como uma companheira com desejos próprios.
Com o ar do tempo, Connie sente-se cada vez mais solitária e emocionalmente negligenciada. A rigidez e indiferença de Clifford, somadas à sua insistência em que ela permaneça confinada à mansão, fazem com que sua infelicidade se torne inável. É nesse contexto que ela conhece Oliver Mellors, o guarda-caça da propriedade, um homem reservado e de origem humilde que também carrega cicatrizes emocionais da guerra. A atração entre eles surge quase de imediato, e o que começa como um simples encontro casual evolui para um caso apaixonado e intenso. As cenas que exploram o relacionamento entre Connie e Oliver são carregadas de erotismo e ternura, mostrando não apenas o desejo físico, mas também uma conexão emocional genuína. A direção de Clermont-Tonnerre se destaca nesse aspecto, oferecendo um retrato delicado e respeitoso da sexualidade feminina, algo que muitas adaptações anteriores não conseguiram fazer de forma tão autêntica.
A performance de Emma Corrin é um dos pontos altos do filme. A atriz traz uma complexidade notável à personagem, capturando sua vulnerabilidade e seu crescente desejo de libertação. Corrin transmite de forma brilhante a transformação de Connie ao longo da narrativa: de uma mulher resignada ao papel que lhe foi imposto pela sociedade para alguém disposta a desafiar as normas e buscar sua própria felicidade. Jack O'Connell também entrega uma atuação marcante como Oliver Mellors. Seu personagem é retratado como um homem de poucas palavras, mas com uma intensidade latente que torna sua presença magnética. A química entre os dois atores é inegável e essencial para que o público compre a ideia de que o amor entre Connie e Oliver é mais do que um simples caso extraconjugal—é uma revolta contra as estruturas sociais opressivas da época.
O roteiro de David Magee faz um trabalho competente ao adaptar a obra de D.H. Lawrence para o público moderno, mantendo o espírito subversivo do romance original. O filme não se furta em explorar temas como a repressão sexual, a divisão de classes e a hipocrisia da aristocracia britânica. No entanto, alguns críticos apontam que, embora a adaptação seja visualmente deslumbrante e repleta de momentos poéticos, ela pode carecer da profundidade emocional encontrada no livro. Algumas das questões filosóficas que permeiam a obra de Lawrence, como a relação entre o ser humano e a natureza ou a crítica ao racionalismo extremo da sociedade industrial, acabam ficando em segundo plano em favor de uma abordagem mais convencional do romance.
A cinematografia de Benoît Delhomme merece destaque especial. A maneira como o filme captura a natureza exuberante que cerca a propriedade de Clifford simboliza a liberdade que Connie busca em sua relação com Oliver. As cenas ao ar livre são filmadas com um lirismo impressionante, contrastando fortemente com os espaços fechados e austeros da mansão Chatterley. Esse contraste visual reforça a mensagem central da história: a ideia de que o amor e a conexão humana são forças libertadoras, enquanto as estruturas sociais rígidas e repressivas aprisionam os indivíduos em papéis predeterminados.
O desfecho do filme permanece fiel ao espírito do romance, embora suavize algumas de suas implicações mais sombrias. Quando o caso de Connie e Oliver é descoberto, Clifford reage com indignação e recusa-se a conceder-lhe o divórcio, mas a protagonista já está decidida a seguir seu próprio caminho. A notícia de que uma lady aristocrática abandonou sua posição social por um simples guarda-caça espalha-se rapidamente, transformando a história do casal em um escândalo. Connie, no entanto, não se deixa abater pelas críticas e decide buscar Oliver, que, por sua vez, encontrou um novo emprego e uma casa na Escócia. A cena final, em que os dois se reencontram e se abraçam, sugere um futuro de esperança e liberdade, em contraste com o conformismo sufocante que dominava o início do filme.
A recepção crítica de O Amante de Lady Chatterley tem sido amplamente positiva. No Rotten Tomatoes, o filme possui uma taxa de aprovação de 86% baseada em 91 críticas, com uma média de 7/10. O consenso dos críticos afirma que esta adaptação se destaca como uma das melhores já feitas, trazendo performances sólidas e uma abordagem refrescante para os temas maduros da história. No Metacritic, a pontuação média do filme é de 67/100, indicando uma recepção favorável, embora menos entusiástica do que em outras plataformas. Muitos críticos elogiam a direção sensível de Clermont-Tonnerre e a atuação de Corrin, mas alguns argumentam que o filme poderia ter mergulhado mais fundo na complexidade dos temas do romance.
No geral, O Amante de Lady Chatterley (2022) é uma adaptação cinematográfica visualmente impressionante e emocionalmente envolvente que faz jus ao legado do romance de D.H. Lawrence. Embora não seja isento de falhas, o filme consegue equilibrar erotismo e sensibilidade, apresentando uma história de amor e libertação que ressoa mesmo em um contexto moderno. A performance de Emma Corrin é um dos grandes trunfos da produção, assim como a cinematografia magistral de Benoît Delhomme. Para os fãs do romance original e para aqueles que apreciam dramas românticos de época, esta versão de Lady Chatterley’s Lover é uma experiência cinematográfica que vale a pena ser apreciada.